Resumos das mesas-redondas - 20ºEIP

RESUMOS DAS

MESAS-REDONDAS

E DAS RESPECTIVAS PALESTRAS

MESA-REDONDA 1


9/11/2021 - Terça-feira

10h - 12h | Horário de Brasília

Mesa-redonda da "Sociedad Latinoamericana Peirce"

Do Self para o Cosmos: Leituras Latino-Americanas de Peirce


A Sociedade Latino-Americana de Peirce promove o estudo do trabalho de Charles S. Peirce, e o intercâmbio acadêmico de pesquisas e pesquisadores de todo o continente. Nesta mesa redonda são apresentados quatro pesquisadores latino-americanos: Catalina Hynes, Presidente da Sociedade Latinoamericana de Peirce; Jorge Alejandro Flórez, da Colômbia; Paniel Reyes Cárdenas e Darin McNaab, do México.

[Versão para o português de Lucas Saran | PUC-SP, Brasil]



PALESTRAS:


Catalina Hynes  | Universidad Nacional de Tucumán, Argentina; Presidente da Sociedad Latinoamericana Peirce   

Lendo "Pesquisas fotométricas" de Peirce 


Como era de se esperar de um pensador tão original, essas pesquisas fotométricas não são nada como um relatório no estilo daqueles publicados pelo Observatório na época. Elas contêm considerações de psicologia experimental em torno da sensação da luz, história da ciência, tradução do catálogo de Ptolomeu, comparação entre diferentes medidas feitas por astrônomos anteriores e contemporâneos, de Ptolomeu a Seidel, através de Brahe, Kepler, Herschel e muito mais. Ele usa essas comparações para se aprofundar no problema do erro nas observações, aplicando estatísticas. Ele não apenas apresenta suas próprias observações originais, uma novidade considerando o Estado da arte dos instrumentos usados, mas ele também avança hipóteses sobre a forma de nossa galáxia, sendo, aparentemente, o primeiro a sugerir sua forma de disco.  No presente trabalho, eu apresentarei algumas chaves de leitura e avaliação deste trabalho. Pretendemos apresentar sua tradução para o espanhol junto com as pesquisas em andamento, com vistas a publicar, em um futuro próximo, uma edição anotada o mais completa possível. Nós também tentaremos avaliar sua importância para várias disciplinas , i.e., a teoria da percepção, e as possíveis conexões com o “Ilustrações sobre a lógica da ciência”. Nós esperamos que estas reflexões sejam úteis, considerando a presença muito escassa deste texto na bibliografia Peirciana.

[Versão para o português de Lucas Saran | PUC-SP, Brasil]



Paniel Reyes Cárdenas  | UPAEP Universidad, Puebla, Mexico; The University of Sheffield, UK 

Cosmologia evolucionária: Peirce e as imagens contemporâneas do Universo


Modelos contemporâneos sofrem da falta de um sistema correto de categorias para entender a realidade do universo em termos de uma visão geral. Em geral, a linguagem da física contemporânea poderia ser limitada pelas suposições comuns de um preconceito fisicalista, cientificista ou materialista.

Esta apresentação tem um objetivo relacionado com a metafísica e a física, mas, mais especificamente, entre a metafísica e a cosmologia. Isso conecta o sistema peirciano de categorias, bem como as doutrinas metafísicas que ele propôs, com a história do cosmos em geral como um sistema evolutivo.

Os conceitos da cosmologia moderna precisam de novas e perspicazes concepções de tempo, espaço, generalidade, continuidade, evolução, acaso, mente, hábito etc. Eu acredito que a fenomenologia e a metafísica peircianas podem fornecer essa bateria de concepções renovadas.

Por isso, esta palestra vai envolver um diálogo que conecta dois objetivos:


  1. Um entendimento mais profundo da cosmologia evolutiva de Peirce, os insights que a própria cosmologia tem como uma teoria original do universo, e a maneira como ela se relaciona com a filosofia pragmatista de Peirce. 
  2. A correlação do pensamento de Peirce com a cosmologia contemporânea e o resultado da interação entre os dois que produz uma abordagem mais profunda da cosmologia.



Jorge Alejandro Florez R.  | Universidad de Caldas, Manizales, Colombia; Editor of Cuadernos de Sistemática Peirceana   

A ordem categorial e a classificação das inferências lógicas


As três inferências lógicas (abdução, indução e dedução) têm recebido atenção particular devido à sua função na crítica lógica e na metodêutica, as duas últimas partes da semiótica, mas sua classificação categorial, a partir da fenomenologia, e sua classificação semiótica, a partir da gramática especulativa, não foram suficientemente discutidas. A dúvida que move esta pesquisa é qual categoria fenomenológica de primeiridade, segundidade e terceiridade corresponde a cada uma das inferências lógicas. As consequências desta classificação categórica refletiriam na classificação semiótica, e, portanto, nós também perguntamos com quais categorias semióticas nós podemos classificar essas três inferências. Eu penso que não há disputa em categorizar a abdução com primazia, mas surge a dúvida sobre a posição da dedução e da indução. Em um manuscrito preparatório para suas conferências em Harvard, sobre pragmatismo, o próprio Peirce diz que classificará a indução como segunda e a dedução como Terceira, mas que ele ainda não tem certeza disto:



Mas se for perguntado hoje [1903] (…) quanto à conexão entre as três categorias e os três modos de inferência, sou forçado a confessar que é obscuro. (…) Agora, eu disse, Abdução, ou a sugestão de uma teoria explicativa, é a inferência por meio de um ícone, e está, assim, conectada com a Primeiridade; Indução, ou observar como as coisas vão agir, é a inferência através de um índice, e está, assim, conectada com a Segundidade. Dedução, ou reconhecimento de relações de ideias gerais, é a inferência através de um símbolo, e, assim, conectada com a Terceiridade. (…) Mas, com o passar dos anos, comecei a vacilar esta posição. E aqui eu imploro que vocês permitam uma explicação pessoal. (…) Eu representei a indução para ser conectada com a terceira categoria e a dedução com a segunda. É desnecessário dizer que eu tive razões para isso que me pareciam fortes na época e que agora me parecem fortes. No momento, estou um tanto disposto a voltar à minha opinião original; mas deixarei as questões sem decisão. (1903, Conferência em Harvard V, citado por Turrisi, 1997 p. 276-277, n. 3).


Embora Peirce deixe a questão sem decisão, eu considero que há razões para sustentar, com maior confiança, que a dedução é a segunda e a indução, a terceira. Por exemplo, uma outra classificação dos tipos de argumentos mostra que a dedução segue os princípios da segundidade e mostra um caso degenerado e um genuíno; e a indução mostra dois casos degenerados e um genuíno, como terceiridade. Em resumo, o objetivo desta apresentação é, então, mostrar os argumentos pelos quais sustento que a dedução é a segunda e a indução, a terceira.

[Versão para o português de Lucas Saran | PUC-SP, Brasil]



Darin McNabb Costa | Universidad Veracruzana, México; Traductor de Peirce al español; Director de “La fonda filosófica” 

O Self em "The Sickness Unto Death" de Kierkegaard: uma leitura a partir  de Hegel e Peirce


“Os primeiros seis parágrafos de The Sickness Unto Death  de Kierkegaard estão entre as passagens mais densas e difíceis de interpretar em toda a sua obra. Lá, ele expõe a natureza do Eu em termos de relações, que muitos interpretaram como uma expressão da dialética de Hegel. Neste ensaio, eu leio aqueles parágrafos em termos da lógica das relações de Peirce e mostro que Peirce nos permite entender Kierkegaard muito mais claramente do que Hegel. Além disso, apesar de tudo que Peirce e Hegel têm em comum, Peirce o critica severamente com respeito à realidade da segundidade. Ao analisar essa crítica e também o que Peirce e Kierkegaard dizem sobre a importância da dúvida vis-à-vis a consciência, eu mostro que uma leitura Peirciana de Kierkegaard é muito mais fecunda do que a estrutura hegeliana que Kierkegaard conhecia. Eu finalizo o ensaio refletindo sobre a possibilidade de se falar de um “Kierkegaard semiótico” e de um “Peirce existencialista”.”

[Versão para o português de Lucas Saran | PUC-SP, Brasil]


MESA-REDONDA 2


10/11/2021 - Quarta-feira

10h - 12h |  Horário de Brasília

Mesa-redonda da "Sociedade Brasileira de Lógica"


A sessão da SBL consistirá em três (3) apresentações, a partir da obra de Charles S. Peirce e além. Com efeito, Peirce aparece atualmente na história da lógica como um dos inventores da lógica matemática, cuja obra e legado ainda restam por ser plenamente conhecidos. Com uma interpretação matematizada das proposições e inferências lógicas, a obra lógica de Peirce mostra-se como fonte de inspiração para sistemas contemporâneos, estendendo a tradição da álgebra da lógica no século XX, de Tarski até as mais avançadas pesquisas em paraconsistência. A sessão será coordenada pelo prof. Dr. Anderson L. Nakano (PUC-SP) e conta com o apoio institucional da SBL. 


PALESTRAS:


Ítala Maria Loffredo D'Ottaviano  | CLE-UNICAMP, Brasil   

Charles Sanders Peirce e a teoria das álgebras relacionais

       

Até meados do século XIX, a pesquisa em lógica era feita no mais das vezes por filósofos e matemáticos sob a influência predominante da tradição aristotélica, a qual baseava-se fortemente na teoria dos silogismos. Neste trabalho, apresentarei Peirce como um dos mais importantes precursores da tradição da álgebra da lógica, particularmente como um dos lógicos que conceberam a teoria das álgebras relacionais.


Edelcio Gonçalves de Souza  |  USP, Brasil   

Paraconsistentização de Lógicas     


Paraconsistentização é um método que serve para transformar qualquer sistema lógico em um sistema paraconsistente. Para isto, dado um sistema lógico definido por uma relação de consequência, construímos um novo sistema de forma que as novas inferências somente são obtidas a partir de conjuntos consistentes de premissas. Esse método é suficientemente geral para ser aplicado inclusive em lógicas cuja linguagem não contém o conectivo de negação. Discutiremos algumas propriedades algébricas do método.


Cassiano Terra Rodrigues  |  ITA, Brasil   

Peirce inventou ou não uma tabela de verdade matemática para os conectivos? 


Peirce talvez não tenha inventado o que hoje conhecemos como tabelas de verdade e alguns comentadores consideram uma questão aberta se ele desenvolveu uma interpretação matemática generalizada de proposições. Defenderei que ele não apenas desenvolveu, sim, uma análise vero-funcional matematicamente abstrata de proposições complexas como ainda desenvolveu um modelo diagramático totalmente original para realizar exatamente o que atualmente se faz com as tabelas de verdade. Esse modelo, ao menos na concepção de Peirce, é perfeitamente matemático e representa plenamente os 16 conectivos elementares, incluindo a negação. 


MESA-REDONDA 3


10/11/2021 - Quarta-feira

10h - 12h | Horário de Brasília

Mesa-redonda do Grupo de Pesquisa "Pragmatismo e Estética" do CEP/PUC-SP


PALESTRAS:


Ariane Porto Costa Rimoli  | Unicamp, Brasil 

Deus é poliglota: diálogos entre Peirce e a ciência quântica sobre a realidade de Deus
 

Em março de 1897, aos 56 anos, desempregado e tentando cuidar da esposa doente, Peirce escreve para seu amigo William James: “Aprendi muito sobre filosofia nos últimos anos, porque eles têm sido anos muito miseráveis e fracassados (...), um novo mundo do qual não sei nada (...) tem se desvelado para mim: o mundo da miséria. (...) Aprendi muito sobre a vida e sobre o mundo, lançando fortes luzes sobre a filosofia durante esses anos. Sem dúvida, a tendência daí derivada é a de valorizarmos mais o espiritual, mas não uma espiritualidade abstrata.... Por outro lado, esta experiência aumenta o senso de reverência através do qual consideramos Gautama Booda.” No texto “C. S. Peirce, Deus e Realismo: a intersecção negligenciada entre ciência e religião”, Arthur F. Stewart aborda o raciocínio abdutivo, as categorias da realidade, a experiência, a distinção entre argumento e argumentação em Peirce enquanto pressupostos de pesquisas interdisciplinares científicas sobre religião e arte, a partir da qual temos que a concepção peirceana de Deus é uma concepção estética. Segundo Prof. Ivo Ibri, o argumento sobre a realidade estética de Deus é a "matriz comum entre os universos mental e material". A partir de 1.900, a visão de mundo quântica começou a buscar explicar a consciência, se libertando da visão de que a ciência deve se encarregar apenas de explicar o funcionamento do mundo material. A percepção consciente de que de existe o sujeito e o objeto, de que existe o “experenciador”, nos remete à noção de consciência. Se para a física quântica a consciência é base de toda a existência e se todas as possibilidades residem em nós devido às nossas experiências, a quântica se apresenta também como a ciência da experiência. A reflexão proposta em “Deus é poliglota: diálogos entre Peirce e a Ciência Quântica sobre a realidade de Deus” reside no estabelecimento de um diálogo até então inédito, onde as considerações de Peirce sobre estética e as ideias contidas em Neglected Argument for the Reality of God (The Hibbert Journal: October 1908), encontram as ideias da Beleza, um dos arquétipos (Verdade, Amor, Beleza, Bondade, Inteireza, Justiça, Self, Abundância, Poder) presentes na Ciência Quântica enquanto contextos para encontrarmos significados maiores na vida. O diálogo seguirá por outras searas abertas pela consideração, por parte de Peirce, de que a Realidade de Deus é axiomática e pode ser usada para organizar cadeias de conhecimento incluindo o espiritual. Quando a ciência pressupõe a religião, nos deparamos novamente com as bases da Ciência Quântica. Abdução e intuição entrarão no diálogo de forma a apontar outras possíveis interfaces conceituais entre Peirce e as Ciências Quânticas para a construção de um universo conceitual que uma ciência, arte e espiritualidade.




Renata Silva Souza; Mariana Vitti Rodrigues | USP, Brasil

Semioses abdutivas: possíveis relações entre arte e ciência no âmbito da fotografia
 
O objetivo deste trabalho é investigar a dinâmica subjacente aos processos abdutivos no âmbito das ciências e das artes. Mais especificamente, discutiremos o papel da abdução nos processos de elaboração, experimentação e construção fotográfica aplicada a ambos os domínios. O mecanismo fotográfico propiciou, desde o início de sua invenção, em meados do século XIX, práticas de documentação que foram aplicadas em diversos contextos como, por exemplo, na medicina, no jornalismo, nas artes e na documentação policial. Com o tempo, há uma expansão do uso fotográfico documental para elaborações expressivas de imagens fotográficas, como é o caso, por exemplo, das imagens de cunho artístico (Rouille, 2019). Tal expansão, ainda hoje, traz questões pungentes sobre a natureza da imagem e de seu valor referencial e documental de fatos do mundo, sobretudo quando o registro fotográfico documental é mesclado com uma alta expressividade estética, no qual há uma predominância contundente de elementos qualitativos expressos nas imagens. Interessa-nos, neste trabalho, entender a dinâmica criativa subjacente à produção fotográfica nos âmbitos das artes e das ciências. Neste cenário, as seguintes questões direcionarão nossa investigação: (1) Que papel o raciocínio abdutivo desempenharia no processo criativo de construção fotográfica? (2) Qual a relevância de se pensar possíveis intersecções relativas aos processos criativos entre práticas científica e artísticas? Para tanto, lançaremos mão do suporte teórico concernente aos trabalhos do filósofo norte americano Charles Sanders Peirce, analisando o conceito semiótico de abdução no âmbito da ação criativa. Abdução é entendida como o único tipo de raciocínio que possibilita o surgimento de novas ideias (Peirce CP 5.171); seu papel na elaboração de hipóteses explicativas é explicitado pelo seu caráter icônico que possibilita a imaginação de cenários possíveis (Pietarinen & Bellucci 2016). Discutiremos em que medida os processos abdutivos de produção fotográfica, no âmbito das ciências e das artes, convergem em virtude do caráter de admiração ou estupefação em face de um dado evento surpreendente que se intenta representar imageticamente. No intento de ilustrar a discussão proposta, traremos exemplos para ressaltar a possível convergência de aspectos criativos da produção fotográfica nas artes e nas ciências.



Lucia F. N. de Souza Dantas | FSB-SP, Brasil

A dinâmica semiótica do processo criativo


Ora entendido como dádiva divina, advindo da inspiração das deusas Musas, tal como descrito no diálogo “Íon” de Platão, ora como resultante da irracionalidade fluida do inconsciente, como sugere Friedrich Schelling em seu livro “A Filosofia da Arte”, o fato é que o processo criativo – para além de outras relevantes concepções que poderíamos relacionar - tem um elemento diferenciado, que não subjaz (pelo menos não integralmente) à automática realização produtiva de uma ideia por meio de um saber advindo de uma racionalidade previamente adquirida. Esta diferença, mesmo que tênue, estaria no bojo da própria definição de arte moderna, saída do contexto do romantismo alemão pós-kantiano, isto é: a arte, a ‘grande arte’, aquela realizada por um gênio artístico, não segue regras. É justamente nesta esteira que a arte será, a partir deste momento, entendida como ‘opera prima’. Em outras palavras, desde o século XIX, arte é arte quando é original, é única e, sobretudo, quando instaura algo novo. Pois o gênio - já esclarecia Kant em sua “Crítica do Faculdade de Julgar” - é aquele que não segue as regras. Mas então, como seria possível estudar arte, como seria plausível haver um conhecimento artístico? Ou sucumbimos à perspectiva kantiana, que aventava que não seria admissível haver uma ciência da arte, ou precisamos admitir que há, sim, uma possível lógica do processo de criação artística. Nesta esteira, ao contrário de Kant, Luigi Pareyson, em seu livro “Os Problemas da Estética”, explica que o artista inventa a regra da arte enquanto elabora a própria obra. Logo, seria possível concluir que a grande arte teria, sim, regras, mas que o artista produziria estas regras enquanto faria a própria obra nascer. Sendo assim, minha hipótese é de que é possível aventar, ou mesmo identificar, uma lógica própria do saber-fazer artístico, que definiria e particularizaria o processo criativo da arte em si mesmo, diferenciando-o de outros processos produtivos. Por outro lado, o filósofo americano Charles S. Peirce, ao detectar uma sutil, mas fundamental diferença entre ‘epagoge’ e ‘apagoge’ - inferências lógicas descritas por Aristóteles em “Primeiros Analíticos” - pontuou que haveria uma inferência específica da descoberta, que ele chamou de abdução, sendo ela a única inferência passível de formular hipóteses rumo a um novo conhecimento e, portanto, passível de fundar novas regras. Embora as preleções de Peirce sobre a inferência abdutiva estejam no âmbito de seus estudos acerca do conhecimento científico, outros conceitos trazidos por ele, como primeiridade (categoria fenomenológica do sentimento e da possibilidade), bem como a sua teoria da percepção, permitem que associemos a sua semiótica - como parte de sua arquitetura filosófica - à filosofia da arte de Pareyson, a fim de percorrer e aclarar os meandros da ação criativa. Portanto, à luz das teorias de Pareyson e Peirce, podemos sugerir que é possível detectar a estrutura do processo semiótico (ou lógico), que permitiria a um artista engendrar novas regras, possibilitando que ele trilhe novos caminhos, desenvolva novas hipóteses, vivencie novas experiências artísticas. Caminhos estes possíveis, sobretudo, por conta da especial capacidade perceptiva que um artista possui - que Peirce chamou de ‘olhar poético’ (CP 5.44) – e que estaria na base da capacidade mesma que o artista tem de ver e imaginar, de perceber e alucinar ao mesmo tempo. Ou conforme Arthur Danto afirmou em “O que é arte”: o artista é aquele que tem a capacidade de compartilhar um sonho acordado (pois sonhar, todos sonham, mas cabe aos artistas dar a ver seus devaneios, transformá-los em produtos de arte, em obras de arte.) Enfim, nosso objetivo é aclarar e esmiuçar as especificidades da dinâmica cognitivo-produtiva da arte, a partir da semiótica peirciana, posicionada em interface com a ‘Teoria da Formatividade’ pareysoniana. 



MESA-REDONDA 4


11/11/2021 - Quinta-feira

10h - 12h |  Horário de Brasília

O pragmatismo de Dewey: entre estética e educação


Apresentamos, nesta mesa redonda, questões deweyanas interligadas que nós investigamos em nosso grupo de pesquisa. Em primeiro lugar, F. Campeotto mostra o pano de fundo da estética de Dewey. Alguns acadêmicos (G. Dykhuizen 1973, G. Biesta 2006, e R. Dreon 2013; 2018) sustentam que a influência de Franz Boas, seu colega da Universidade de Columbia, pode ser rastreada até várias das principais obras de Dewey. Além disso, argumentou-se (Dreon 2013) que uma influência explícita da antropologia cultural caracteriza a posição filosófica madura de Dewey, que, em 1940, ele chamou de “Naturalismo Cultural”, e que ele entendeu como uma extensão ‒ ou uma superação ‒ de seu instrumentalismo. Em contraste, a hipótese de Campeotto é que uma abordagem antropológica se desenvolveu lentamente na filosofia de Dewey já durante seu período na Universidade de Chicago (1894-1904), quando ele era diretor do Departamento de Filosofia, Psicologia e Pedagogia. Esses traços antropológicos tornam-se evidentes analisando-se as incursões esporádicas no campo da estética por Dewey e colegas do departamento que trabalharam com ele (especialmente Tufts).

Em segundo lugar, Juan Manuel Saharrea apresenta algumas ligações entre os conceitos de democracia experimental, experimentalismo e educação no interior do pensamento de Dewey. Para realizar esta tarefa, ele divide o trabalho em duas partes. Primeiro, ele destaca uma recuperação recente do experimentalismo de Dewey na filosofia política pragmatista (Anderson 2006; VanderVeen 2011; Pappas, 2012; Forstenzer, 2019). Saharrea destaca uma questão negligenciada nesta literatura: há poucas referências à ligação entre experimentalismo e educação. Em segundo lugar, ele enfatiza as referências de Dewey ao âmbito do experimentalismo, defendendo conceitualmente e empiricamente a educação democrática (Oliverio, 2018 e 2020). Para este fim, ele reconstrói o experimentalismo de Dewey a partir de seus textos educacionais do período que vai de The Bearings of Pragmatism Upon Education (1909-09), até Democracy and Education (1916). Finalmente, ele sustenta que os “hábitos científicos de pensamento” defendidos por Dewey em seus textos educacionais podem constituir, hoje, uma resposta pedagógica adequada aos desafios enfrentados pelas democracias contemporâneas: fortes tendências de polarização (Talisse, 2019), posições autoritárias, e, mesmo, fascismo “como um fenômeno retórico autopropagável nas redes sociais” (Crick, 2020 ‒ recentemente exacerbado pela pandemia de COVID-19, ver também Crick 2019, Lekan 2020).

Finalmente, C. Viale apresenta a relação entre estética e educação no pensamento de Dewey. Para realizar esta tarefa, ele divide esta palestra em três partes. Na primeira (Dewey e a educação: questões centrais), ele apresenta aspectos chave deste tópico. Na segunda (A gênese da Estética de Dewey. Uma reinterpretação), ele argumenta sobre como interpretar o surgimento da estética de Dewey. Enquanto isso, na Terceira sessão (Duas raízes negligenciadas da Estética de Dewey), ele desenvolve seu argumento descrevendo como recuperar essas fontes, por um lado, e mostrando como a estética de Dewey pode/poderia ser, criticamente, reavaliada ou reconstruída a partir de um ponto de vista contemporâneo, por outro. Finalmente, ele apresenta uma conclusão.

[Versão para o português de Lucas Saran | PUC-SP, Brasil]

 

PALESTRAS:


  • Fabio Campeotto  | CONICET/UNLaR/UCC, Argentina   
  • As raízes antropológicas da Estética de Dewey: uma abordagem preliminar       


  • Juan M. Saharrea  | CONICET/UNC/UCC, Argentina   
  • Experimentalismo, democracia e educação. Raízes deweyanas para problemas atuais       


  • Claudio M. Viale |  CONICET/UCC, Argentina   
  • Duas raízes negligenciadas da Estética de Dewey



MESA-REDONDA 5


11/11/2021 - Quinta-feira

10h - 12h | Horário de Brasília

Mesa-redonda do Grupo de Pesquisa "Pragmatismo e Ética" do CEP-PUC-SP

 

A temática desta mesa visa estimular a reflexão sobre a validade do pluralismo e do multiculturalismo contemporâneos à luz dos conceitos da razão pública, a qual pode traçar e delimitar os espaços para tolerância e aceitação de diferentes opiniões, em um novo mundo no qual as mídias abrem-se à formação de grupos identitários. A base para tal reflexão rumo a uma abordagem que não abandone o conceito de justiça, ao que parece, alinha-se às éticas de pretensão racional associadas ao pensamento contemporâneo, ou seja, fundadas no que se convencionou chamar de virada linguística – hermenêutica – pragmática, e que centralizam seu debate no trato da questão de consenso e dissenso na esfera pública, sem perda da liberdade e autonomia individual. Nessa nova condição, tornou-se comum a formação de correntes de pensamento autodenominadas pós-metafísicas, que se afastam da metafísica transcendental, de cunho religioso e ou teleológicos. Por outro caminho, impõe-se avaliação da chamada ética de tradição, como um desafio da abordagem racional na relação pertença e distanciamento na qualificação do bom e justo. Assim, reapresentam-se as grandes questões de como conciliar o ponto de vista subjetivo, que desde Kant, é dado que a constituição de opiniões, por livre arbítrio, tem o caráter de liberdade do incondicionado, com a liberdade de caráter intersubjetivo, envolvidos ainda os conceitos de autonomia e heteronomia. Mais ainda, refletir como tratar o fenômeno do pluralismo contemporâneo, sem que o desacordo possa ser entendido como uma fase transitória de um processo, pelo qual se espera, em futuro, um acordo direcionado por ideias de grupos meramente hegemônicos. E, com relação ao direito público declaratório e positivo, ele também é espaço da autonomia privada dos cidadãos, implicando que autonomia privada e pública se pressupõem mutuamente. O Pragmatismo, ao trocar a “constituição” kantiana das opiniões pela “experiência’, o seu próprio vetor, apresenta-se como alternativa para estudar a pluralidade como fenômeno e refletir sobre a sua natureza, hoje espraiada na multiplicidade de proposições e enunciados em esferas divergentes, remetendo a reflexões sobre as possíveis aplicações da razão pública. O Pragmatismo, mesmo quando não se adota a distinção estrita entre aparência e realidade, não abandona a pergunta sobre a realidade como tal. De tal modo, ele põe-se a enfrentar o desafio epistêmico/procedural das ilimitadas pluralidades das identidades individuais e da formação de grupos identitários diversos das hegemonias predominantes.


PALESTRAS:


  • Antonio Wardison C. da Silva  | UNISAL, Brasil   
  • Apel com Weber e contra Weber: crítica à metafísica tradicional e urgência de uma ética pragmático-transcendental no limiar da linguagem filosófica       


  • Júlio D'Oliveira  | CEP/PUC-SP, Brasil   
  • O pragmatismo peirciano como possível tabula salutis do produto judicial desejável     


  • Arthur Araújo | UFES, Brasil   
  • Pragmatismo, fatos, valores, significação       


  • José Luiz Zanette |  CEP/PUC-SP, Brasil   
  • O reino dos fins kantiano, destranscendentalizado, como possível vetor pragmático/formal na conciliação entre o público e o privado


MESA-REDONDA 6


12/11/2021 - Sexta-feira

10h - 12h |  Horário de Brasília

A semiótica e a comunicação: uma cartografia de pluralidades e confluências no PPGCOS da PUC-SP


No contexto dos cursos de pós graduação em Semiótica presentes em várias partes do mundo, o PPGCOS se destaca pelas interconexões que propõe com o campo da Comunicação. Graças ao pioneirismo de seus fundadores, o COS, desde suas origens, em 1970, já nasceu com a presença da Semiótica. Para o 20º Encontro Internacional sobre Pragmatismo, o PPGCOS organizou uma mesa com o desafio de promover um espaço de discussão sobre a importância da Semiótica nas pesquisas que vem sendo conduzidas há mais de cinquenta anos. Constituída por docentes representantes das três linhas de pesquisa e pela Coordenação do Programa, a mesa visa incitar o diálogo e tecer um panorama por entre as pluralidades e confluências dos estudos. 


PALESTRAS:


  • Lucrécia Ferrara   | PUC-SP, Brasil   
  • Ressonâncias semióticas na comunicação       


  • Norval Baitello  |  PUC-SP, Brasil   
  • Ciências da Cultura: três propostas de leitura semiótica de macro-ambientes - Flusser, Watsuji, Warburg     


  • Ana Cláudia Oliveira  |  PUC-SP, Brasil   
  • Múltiplas perspectivas da semiótica no PPGCOS da PUC-SP       


  • Lucia Leão  |  PUC-SP, Brasil   
  • A semiótica e a comunicação: uma cartografia de pluralidades e confluências no PPGCOS da PUC-SP

MESA-REDONDA 7


12/11/2021 - Sexta-feira

14h - 16h |  Horário de Brasília

Em diálogo com o Pragmatismo


PALESTRAS


Enrico Monacelli  |  State University of Milano, Itália  

A política da verdade: Jean Wahl como pragmatista       


Jean Wahl tem sido uma das figuras mais negligenciadas nos estudos pragmatistas. Embora seja um dos pensadores na Europa a levar o pragmatismo a sério em todas as suas várias implicações conceituais, pouco foi escrito sobre seu trabalho e seu legado. Apenas recentemente testemunhamos um interesse esparso em seu trabalho sobre a tradição americana, que não tem, na maioria das vezes, um compromisso sério com a forma como o pragmatismo participou do pensamento de Jean Wahl. Particularmente, a maioria dos estudos tem descrito o engajamento de Jean Wahl com o pragmatismo como meramente um caso historiográfico, relegado a seus primeiros trabalhos (Les philosophies pluralistes d'Angleterre et d'Amérique e Vers le concret), uma espécie de período informal americano.

Ao contrário disso, tentaremos manter uma tese muito mais ousada: Jean Wahl era um pragmatista por completo, embora de um tipo peculiar. Para provar essa afirmação, nos concentraremos no trabalho metafísico maduro de Jean Wahl, L'expérience métaphysique, um trabalho supostamente distante do período americano de Wahl. Tentaremos entender o papel desempenhado pelo pragmatismo nesse livro, respondendo a três perguntas principais na ontologia wahliana: o que é experiência? O que é metafísica? E por que ambas são, de certa forma, pragmáticas? 

[Versão para o português de Tobias Faria, PUC-SP, Brasil]


Silvia Zanelli  | University of Bergamo, Itália  

O universo como um vasto representâmen: a cosmossemióse como uma lógica de eventos. Um diálogo entre Charles Sanders Peirce e Gilles Deleuze


Nesta apresentação tentaremos propor uma leitura contemporânea do pensamento de Charles Sanders Peirce, utilizando algumas das ferramentas conceituais oferecidas pela filosofia de Gilles Deleuze. O primeiro objetivo deste trabalho é apresentar uma visão holística e cósmica do signo, focando nos conceitos de pansemioticismo e cosmossemióse. Em segundo lugar, tentaremos fornecer uma cartografia do conceito de individuação (ou “secundidade”), em sua relação com a dimensão de pré-individualidade e generalidade, unindo assim a ontologia e a semiótica. O “fio condutor” será cruzar as dimensões pragmáticas, cosmológicas e semióticas do pensamento de Peirce, considerando-as como uma rede entrelaçada e aberta e levando em conta a transdisciplinaridade constitutiva, profundamente característica e intrínseca de sua filosofia. Para isso, vamos nos basear em alguns conceitos deleuzianos, focando especialmente no tema da impessoalidade, anonimato e pré-individualidade. Se a filosofia de Peirce em suas mais recentes reinterpretações tende a permanecer à sombra de uma teoria puramente semiótica como um campo exclusivamente humanista, em vez disso, através do pensamento deleuziano, proporemos superar uma semiótica logocêntrica e centrada no humano, analisando o conceito de signo a partir de uma perspectiva não antropocêntrica e não especificamente voltada à espécie. Neste sentido, aprofundaremos e problematizaremos o caminho da anonimização do processo de interpretação que toma forma dentro do trabalho de Peirce, seguindo a ideia de que o universo se apresenta como um vasto representâmen e discutir a noção peirceana de “quase-mente”. Por fim, vamos nos concentrar na dimensão cognitiva, informativa e relacional de todo o Real, a fim de abandonar o terreno do Significante como correlativo da individuação subjetiva, propondo uma semiótica de continuidade e de intensidades, a ser pensada como um processo de individuação do Signo, uniforme e cósmico. Também consideraremos o tema da individuação, refletindo sobre a dívida comum que a filosofia de Duns Scotus exerce tanto sobre o pensamento de Deleuze quanto sobre a filosofia de Peirce com respeito ao tema da hecceidade para mostrar como em ambos os pensadores há uma profunda resemantização da ideia inveterada do universal abstrato, em direção a uma filosofia do virtual, entendida como um geral maximamente eficiente e “concreto”. A universalidade será, portanto, redefinida de acordo com os limites de uma generalidade inter res em vez de ser apresentada como uma construção in re ou ante rem, assim como o poder do geral em Peirce e do virtual em Deleuze -, entre os quais tentaremos notar as semelhanças e afinidades-, serão considerados precisamente em sua eficácia através de entidades, como uma regra de conduta pré-individual e imanente ou singularidade.

[Versão para o português de Tomas Dunkenmolle, PUC-SP, Brasil]


Michal Jan Karľa  | Charles University, Faculty of Humanities, Czech Republic   

Sobre as origens da lógica da ciência de Peirce


O objetivo deste artigo é mostrar como certas doutrinas conectadas – estreita ou vagamente – com o pragmaticismo de Peirce, p.ex., critical common-sensism, realismo escolástico (1905, EP 2:346 ss.), falibilismo (p.ex., 1898, EP 2:44; 1913, EP 2:469), e a lógica da abdução (1903, EP 2:226), originaram-se em seus primeiros escritos da década de 1860. Mais concretamente, vou me concentrar em como elas foram desenvolvidas como respostas a questões específicas da metafísica de Peirce. Ao ler os escritos de Peirce sobre metafísica (e semiótica) da década de 1860, dois pontos de virada cruciais emergem. O primeiro concerne à mudança de Peirce da metafísica das “condições primárias de toda a ciência” (1861, W 1:59) para lógica/semiótica, dando conta das condições de possibilidade do raciocínio (científico) (1865, W 1:183). O segundo é a mudança da metafísica concebida como sendo um projeto analítico, a priori, (1861, W 1:59) para a metafísica que procede sinteticamente, produzindo hipóteses e testando seus resultados (1868, W 2:165 ss.). Argumentarei que as mudanças indicadas não são contradições, mas desdobramentos diferentes (e, em última análise, consistentes) da hipótese inicial de Peirce de que toda a cognição é em signos (ver, p.ex., 1868, W 2:162), o que é confirmado uma vez que sua teoria da cognição seja desenvolvida em detalhes suficientes (1868, W 2:193 ss.). Além disso, ao lado dessas mudanças Peirce foi capaz de estabelecer as bases das doutrinas mais tarde incluídas sob o guarda-chuva do pragmati(ci)smo – sua teoria metafísica de fé (1861, W 1:74-79) sendo o precursor do falibilismo e da lógica da abdução, a teoria semiótica posterior da cognição (1868, W 2:193 ss.) estabelecendo a base de seu mais tarde critical common-sensism e realismo escolástico.

[Versão para o português de Tobias Faria, PUC-SP, Brasil]


Edivaldo José Bortoleto  | UFES, Brasil   

Paulo Freire Semiótico?


O título deste ensaio já é o tema e o problema. Tema, enquanto questão que ganha importância neste ano em que se comemora o centenário de nascimento de Paulo Freire (n.19.09.1921 – m. 02.05.1997). Problema, porque a pergunta que se impõe é: Paulo Freire Semiótico? Assim, no centenário de Paulo Freire se quer enveredar pelo campo da Semiótica e mirar sua obra desde aí. Inegavelmente, a concepção humanista e libertadora de Paulo Freire tem dimensão nacional, latino-americana-caribenha e mundial. Desde o conceito de afinidades eletivas subsumido da obra de Goethe é possível encontrar e reconhecer afinidades eletivas em Paulo Freire. Nele se encontram: Humanismo Cristão – Mounier, Maritain, Bernanos, Amoroso Lima, Ernani Maria Fiori; Idealismo Alemão – Kant, Hegel; Marxismo – Marx, Engels; Existencialismo – Sartre; ISEB – Álvaro Vieira Pinto; Fenomenologia – Husserl, Merleau-Ponty; e, Pragmatismo – Dewey, Anísio Teixeira. A envergadura mundial da obra de Freire se deveu ao muito que ele leu e viveu. Uma constelação de autores encontram-se em suas formulações. Aqui, tão somente alguns, para exemplificar o quão Paulo Freire viveu o que escreveu: Ninguém liberta ninguém, ninguém se liberta sozinho: os homens se libertam em comunhão. Seu pensamento, portanto, tem o signo da comunhão, laços de linguagens estabelecidos com outros campos semânticos de linguagens. Ação e reflexão, portanto, são as chaves dialetizadoras de seu pensamento. Mas, Paulo Freire tem contato com o Pragmatismo Norte Americano via Anísio Teixeira que ele chama de Meu Mestre. Mas se há uma Semiótica em Freire – e há - ela não vem daí, da longa tradição norte-americana desde Peirce. Ela tem uma outra origem. A Semiótica presente no pensamento de Paulo Freire e, talvez a Semiótica estruturante de seu pensamento, vem da Fenomenologia de Maurice Merleau-Ponty que subsume o estruturalismo linguístico de Ferdinand de Saussure. Assim, via a Fenomenologia de tradição francesa, chega até Paulo Freire a Semiótica Europeia tomada enquanto Semiologia. Ora, pode-se dizer, então, que em Paulo Freire Fenomenológico há um Paulo Freire Semiológico. Esta é a questão deste ensaio, qual seja, mirar um Paulo Freire Semiológico mas que pode também ser mirado enquanto Semiótico. Assim, a Semiologia Saussuriana que se encontra em Freire pode ser também, em forma de afinidades eletivas aproximada da Semiótica Peirceana. A operação deste expediente pode abrir outras possibilidades e horizontes no pensamento freireano, portanto. E quais são estas possibilidade e horizontes? Ora, enfrentar esta questão, significa subsumir Paulo Freire no horizonte da linguagem, portanto, subsumir Paulo Freire enquanto um filósofo que também se moveu no horizonte do giro linguístico. A questão da linguagem, a virada da linguagem – Linguístic turn – se impõe, portanto. Aqui, então, parece-me residir algo de inédito no tocante aos estudos freireanos para fazer seu pensamento avançar sem ser repetido e tirá-lo do perigo de uma dogmática. Frege com sua Lógica e Matemática e Nietzsche com sua linguagem filosófica estão no marco inicial desta questão. O Neopositivismo, o Círculo de Viena e a Filosofia Analítica, principalmente, Moore, Russell e Wittgenstein levam este debate até hoje. Quanto ao campo Semiótico que vem desde a medicina grega, passando pela medievalidade e modernidade, ganha em Saussure com o Curso de Linguística Geral, forma elevada na cultura europeia, em cuja formulação o signo tem uma natureza vocal e uma natureza psíquica, portanto, sua imagem acústica, significante, e a ideia (conceito), significado. Com Charles Sanders Peirce, do outro lado do Atlântico, o “signo é aquilo que, sob certo aspecto ou modo, representa algo para alguém”. Em sua arquitetônica filosófica a Semiótica enquanto Lógica toma a linguagem enquanto verbal e não-verbal e, o signo em sua trifurcação objeto-ideia-interpretante e, a Fenomenologia, distinta da de Husserl, move-se em uma concepção de realidade onde há um primeiro (Primeiridade), um segundo (Segundidade) e um terceiro (Terceiridade). Mas não podem ficar fora deste grande campo da linguagem, a Psicanálise formulada por Freud que a toma como uma Meta-Psicologia enquanto uma crítica à Psicologia e à Neurologia; a Escola de Tártu-Moscou movendo-se nos campos da Cultura, da História, da Comunicação com Lotman e tantos outros; bem como, com a Fenomenologia de Husserl. As perspectivas abertas pela Semiótica Psicanalítica, pela Semiótica Russa e, pela Semiótica Fenomenológica foram decisivas, e seguem sendo, para a compreensão do signo enquanto uma produção do Inconsciente, da Cultura e da Intencionalidade. Mas, de maneira mais imediata, a Semiótica Fenomenológica é aqui desenvolvida mais que as duas anteriores – a Semiótica Psicanalítica e a Semiótica Russa – porque em Merleau-Ponty ela se encontra com a Semiologia Saussuriana. Parece estar aqui um ponto de encontro e de comunhão de Paulo Freire, portanto, de afinidades eletivas, onde pode-se pensar a presença da Semiologia Saussuriana em Paulo Freire também, principalmente, na concepção de signo que fundamenta o pensamento freireano. Ou, dizendo d’outra maneira, a concepção de signo em Freire vem de Ferdinand de Saussure via Merleau-Ponty. Detenho-me, então, na Fenomenologia de Husserl por uns instantes. A Fenomenologia de Husserl é uma crítica ao Positivismo e ao Psicologismo. O objeto para a Fenomenologia não é mais o objeto existente do senso comum mas construído, agora, na consciência. A Fenomenologia, portanto, não é uma mera descrição, mas sim, uma Lógica. Assim, pode-se dizer que a questão da linguagem em Husserl já se encontra em suas obras, A Origem da Geometria e As Investigações Lógicas. Ora, parece, então, já existir em Husserl um giro da linguagem, podendo-se falar que há nele uma concepção de linguagem enquanto um “a priori constitutivo”. Isto também acontece em Merleau-Ponty. Seus textos sobre a linguagem como Sur la Phenomenologie du Langage e Le Langage Indirect et les Voix du Silence acenam uma concepção de linguagem enquanto um “a priori constitutivo”. Assim, a Semiologia Saussuriana fornece a linguagem enquanto ela mesma sendo um “a priori constitutivo”. O que Saussure, Peirce e Husserl têm em comum? Os três têm em comum a elevação do pensamento e da linguagem à esfera da Lógica e da Matemática. Há entre os três uma lógica, portanto. Em Paulo Freire, por sua vez, parece-me ser a questão da linguagem a questão central. Este é o ponto de partida aqui assumido. Pode-se dizer que há um “a priori constitutivo” em Paulo Freire no tocante à questão da linguagem. No entanto, parece-me também que a teoria da linguagem em Freire carece de ser elaborada, desenvolvida, explicitada. Ela está lá, atravessando e dando forma a toda sua obra. O que se objetiva agora, portanto, é tomá-la como objeto de reflexão: Paulo Freire Semiótico? Paulo Freire em Importância do Ato de Ler diz que “a leitura de mundo precede a leitura da palavra”. A criança, portanto, antes de dizer e ler a palavra tem outras mediações de leitura do mundo tais como: os gestos, o olhar, o tato, o olfato, a visão, a audição, os movimentos do corpo, o próprio corpo. Este momento pode ser aproximado com a Primeiridade de Peirce onde a criança acessa à dimensão qualitativa do mundo. Mas é verdade também que, esta leitura de mundo que precede a palavra, supõe antes, o signo como precedente. Esta é a mediação primeira de acesso ao mundo. Sem os signos que constituem os momentos da Primeiridade (Experiência), da Segundidade (Ação-Reação) e da Terceiridade (Raciocínio, Argumento), o mundo enquanto objeto-signo, portanto, Representamen, o mundo do humano, portanto do outro e, o mundo de Deus, o totalmente outro não poderiam e não podem ser lidos, pensados, ditos, refletidos. Se a leitura de mundo precede a leitura da palavra, o signo precede a leitura da palavra e não há um anterior ao signo. Em Pedagogia do Oprimido, Freire diz que “quando tentamos um adentramento no diálogo como fenômeno humano, se nos revela algo que já poderemos dizer ser ele mesmo: a palavra”. Louis Hjelmslev em Ensaios Linguísticos no mesmo diapasão de Saussure diz que “o termo linguagem é aqui tomado no sentido técnico que usualmente lhe é atribuído na literatura científica de língua francesa e que foi precisado e codificado no Cours de linguistique générale, de F. de Saussure: a linguagem é a totalidade constituída pela língua e pela fala. Assim, em Saussure se está no âmbito da linguagem verbal, tal qual em Merleau-Ponty e tal qual em Freire. Portanto na linguagem enquanto um “a priori linguístico”. Assim, pode-se dizer de um Paulo Freire Semiótico desde o modelo paradigmático semiológico saussuriano. Desta forma pode-se estabelecer afinidades eletivas entre Saussure, Hjelmslev, Merleau-Ponty, Freire. Mas, também pode-se perguntar: o que significaria e o que ganharia o pensamento freireano sendo deslocado para outras bases semióticas, ou seja, para o modelo paradigmático semiótico peirceano? Como pensar Paulo Freire e sua arquitetônica filosófico-pedagógica-libertadora desde um “a priori semiótico” enquanto concepção de linguagem verbal e também não-verbal? Como ler-pensar-dizer-refletir-querer-amar o corpo-signo, o mundo-signo e deus-signo sob uma concepção de linguagem tanto verbal e não-verbal no sentido de estabelecer conhecimento, diálogo e comunhão no signo e pelo signo? Paulo Freire ainda em Pedagogia do Oprimido diz que “não há palavra verdadeira que não seja práxis. Daí que dizer a palavra verdadeira seja transformar o mundo”. Ora, parafraseando Paulo Freire poderia se dizer que “não há signo verdadeiro que não seja práxis e, dizer o signo é transformar o mundo”. Ora, desde estas premissas, pode-se entender, ampliar e complexificar o conceito de diálogo enquanto semiose – expansão do signo - onde todos os signos verbais e não-verbais vão juntos. A aprendizagem também pode ser entendida, ampliada e complexificada enquanto uma semiose onde todos os signos jogam. A própria compreensão de conscientização, porque neste processo o interpretante faz-se, modifica o próprio lugar do sujeito que, necessariamente, não seja o centro, mas sim, o próprio processo semiótico enquanto processo de aprendizagem e enquanto processo de conscientização não centrado em um quem mas em comunhão verdadeira e amorosa com os signos.


MESA-REDONDA 8


12/11/2021 - Sexta-feira

14h - 16h |  Horário de Brasília

Lógica e Semiótica em Peirce


PALESTRAS:


Alessandro Ballabio  | UPN, Colombia   

O raciocínio abdutivo à luz das noções de informação e feedback     


A forma tradicional de analisar e compreender os fenômenos naturais, técnicos e tecnológicos tem sido fundamentada no padrão de causalidade eficiente, pelo menos até a crítica aguda de Hume. Não há dúvida que o princípio tradicional da causalidade direta ou eficiente é adequado para explicar o funcionamento de múltiplos e diversos fenômenos naturais, técnicos e tecnológicos: dada certa informação de entrada (input), se ela for conservada ao longo de todo o processo, teremos certo efeito na saída (output). A este respeito, tanto C.S. Peirce (1839-1914) como G. Simondon (1922-1989) lamentam a inadequação do esquema de causa eficiente para descrever o fenômeno da "ressonância interna", que é bastante descrito por uma causalidade recorrente ou circular e que caracteriza tanto o raciocínio abdutivo como a evolução de um sistema cibernético. 
O que é um sistema cibernético e o que ele tem a ver com o raciocínio abdutivo? De acordo com Simondon, "reconhecemos o funcionamento de um sistema holístico [cibernético] no fato de que a atividade do sistema é modificada de forma permanente pelos resultados dessa atividade; [...] Essa recorrência dos efeitos da atividade sobre a atividade é chamada de reação, feedback ou ressonância interna. Com a reação começa o sistema cibernético". Segundo Simondon, a essência de um sistema cibernético reside no funcionamento de um modulador ou relé. Cada modulador consiste em duas entradas (entrada de energia e entrada de informação), e uma única saída. "Há uma entrada de energia (força sem forma), uma entrada de informação (forma sem força) e uma saída que é uma síntese entre o sinal e a energia potencial, ou seja, uma força informada ou uma energia modulada por um sinal". Agora bem, no modulador ou relé, o sinal condiciona ou informa a força e produz um efeito (uma energia modulada) em saída que retorna sobre o grupo de entradas e as modifica: "há retorno da causalidade do grupo alimentação-efetor sobre a forma-sinal". Se voltarmos à definição de abdução que Peirce enunciou em 1903, podemos entender em que sentido se caracteriza por certa ressonância interna ou causalidade circular: "(1) O surpreendente fato C é observado; (2) mas se A fosse verdadeiro, C seria uma coisa comum, (3) então há razões para suspeitar que A é verdadeiro" (EP2: 231, 1903). A abdução é um procedimento que anda para trás (Retrodução): do efeito à causa. A abdução é um tipo de raciocínio que tem dois inputs e uma conclusão: o fato ou resultado observado (1) constitui a matéria (energia sem forma) do raciocínio; a hipótese ou caso formulado (2) constitui sua forma (forma sem energia); e, finalmente, a regra ou a causa (3) que explica o efeito observado com base na hipótese formulada: é o output do sistema/raciocínio, condicionado tanto pela matéria quanto pela forma do procedimento abdutivo. A conclusão do raciocínio abdutivo produz um efeito de retorno sobre o efeito observado e sobre a hipótese formulada: retorna aos inputs ou premissas do raciocínio e interpreta uma indicação, um resultado observado "como se" fosse o caso de uma regra geral, como se fosse um elemento pertencente a um horizonte perceptivo mais amplo, alargando assim o nosso conhecimento. É um tipo de raciocínio que tem um feedback performativo nas suas próprias instalações, como acontece no modulador ou sistema cibernético, concebido por Simondon.

Finalmente, tanto no raciocínio abdutivo como no modulador, duas formas de sinais ou informações são combinadas: uma informação de entrada e uma informação de feedback que modifica permanentemente o sinal de entrada. Enquanto houver um efeito ou uma causalidade de retorno da energia informada de saída (a regra) sobre o grupo de entrada inicial (o resultado e o caso), é produzida uma ressonância interna, ou seja, uma causalidade circular ou recorrente que reestruture permanentemente o nosso raciocínio e a forma de existência de um sistema cibernético. Em conclusão, estes são dois sistemas performativos que nos convidam a pensar na simultaneidade, reciprocidade e performatividade entre causa e efeito como a essência da nossa lógica e a forma de ser de um sistema cibernético.

[Versão para o português de Maria Alejandra Madi | PUC-SP, Brasil]

 Isabel Victoria Galleguillos Jungk |  PUC-SP, Brasil 

 A dedução inicial das categorias universais de Peirce     


A trajetória de Peirce está fundamentada nas ideias seminais de seu artigo Sobre uma nova lista de categorias (1867) no qual ele desenvolve um conjunto de concepções universais que ele demonstra serem necessárias para a unificação das impressões da experiência. Ele afirma, desde esse momento inaugural, que, apesar de não ser totalmente satisfatória do ponto de vista lógico, essa nova lista é um de seus trabalhos de maior força filosófica, resultado de uma década de trabalho, dos quais os últimos dois anos foram de intensa dedicação. Pedra fundamental de seu edifício científico-filosófico, as três categorias universais de Peirce são pós-kantianas, pois partem de uma crítica à lista de categorias proposta por Kant, que não são passíveis de serem encontradas em todos os tipos de fenômenos.

Peirce inicia seu artigo de 1867 afirmando basear-se “na teoria já estabelecida segundo a qual a função dos conceitos é reduzir a multiplicidade das impressões sensíveis à unidade e de que a validade de um conceito consiste na impossibilidade de reduzir o conteúdo da consciência à unidade sem a sua introdução” (1867, EP 1, p. 1). Nesse parágrafo inicial, Peirce se refere à teoria kantiana, embora seja possível detectar diferenças genuínas entre os pensamentos de Peirce e Kant. As categorias kantianas são materiais e particulares e Peirce busca descrever somente aquelas elementares, universais que estejam presentes à mente a qualquer momento em que algo se apresente a ela; sendo que o mesmo raciocínio pode ser aplicado às categorias aristotélicas. Para Peirce, as categorias filosóficas devem ser universais e onipresentes em todo e qualquer fenômeno, motivo pelo qual, anos mais tarde, após longos estudos, ele as propôs como categorias fundamentais do pensamento e da natureza (1885).

O desejo de Peirce de chegar a concepções claras e distintas, a partir da análise da experiência que se força sobre nós, sem recorrer aos resultados de filosofias prévias, era, mais do que uma ambição, uma constatação de que as categorias anteriormente propostas sofriam de vícios que impediam que elas fossem concepções dotadas do grau de generalidade necessário à fundação de uma teoria filosófica abrangente, que não ficasse limitada a este ou aquele campo da experiência. Nos manuscritos de Peirce podem ser encontrados quatro rascunhos parciais ou versões preliminares do texto de 1867 e, a partir de trechos da versão final e das versões prévias, que contêm alguns desenvolvimentos que não aparecem no texto publicado, é possível ter uma ideia aprofundada de como as categorias foram elaboradas nesse momento inicial, fornecendo indicações importantes acerca de sua natureza.


Tobias Augusto Rosa Faria  | Facapa e Unicamp, Brasil   

Notas sobre o geral e o vago: o caso da lógica triádica de Peirce       


Este trabalho procura investigar o estatuto lógico da generalidade e da vagueza na filosofia de Peirce. Para o filósofo, ambas são formas de indeterminação e, como tais, se opõem à singularidade, que marca o que é individual e definido. Nesse sentido, uma proposição é geral se é quantificada universalmente, ao passo que uma proposição é vaga se é quantificada existencialmente. Peirce acrescenta que ao geral não se aplica o princípio do terceiro excluído, enquanto ao vago não se aplica o princípio da não contradição. Uma vez que ambos os princípios constituem – ao lado do princípio da identidade – a base da lógica clássica, é lícito questionar se sua inaplicabilidade a proposições gerais e vagas teria relação com outra formulação lógica proposta por Peirce, nomeadamente a lógica triádica. A lógica triádica contempla três valores de verdade – V (verdadeiro), F (falso) e L (limite) – e seis conectivos. Ela é caracterizada, nas palavras de Peirce, por reconhecer que “cada proposição S é P, ou é verdadeira, ou é falsa, ou tem um modo de ser inferior tal que ele [S] pode não ser determinadamente P, nem determinadamente não-P, mas estar no limite entre P e não-P”. Dado o vínculo estabelecido por Peirce entre generalidade e princípio do meio excluído, alguns comentadores têm interpretado L como valor para proposições gerais. Outros comentadores (por exemplo, Chiasson), avaliando o significado filosófico do valor L, têm defendido que ele valora proposições vagas, às quais não se aplica o princípio da não contradição. Seguindo Lane, argumenta-se aqui que o valor L parece dizer respeito a proposições que violam o princípio do meio excluído, ou seja, para as quais o princípio é falso. Isso, no entanto, exige que o princípio seja aplicável às proposições em questão, de modo que elas não podem ser gerais – têm de ser individuais. Para Lane, proposições com valor L se referem a situações em que há quebra de continuidade, assunto central na filosofia madura de Peirce.


José Renato Salatiel  | UFES, Brasil   

 Lógica Triádica de Peirce: uma nova abordagem


Peirce é hoje reconhecido como um dos pioneiros da lógica matemática e albébrica, mas seu trabalho original em lógicas não-clássicas recebe ainda pouca atenção fora do estreito círculo de especialistas peircianos. Experimentos com matrizes de lógicas trivalentes foram registrados em seu Logic Notebook, em um conjunto de manuscritos inéditos datados de 1909, uma década antes de sistemas similares terem sido descobertos por outros lógicos. Desde a publicação parcial desses manuscritos em 1966, por Fisch e Turquette, a lógica triádica, conforme nomeada por Peirce, tem sido motivo de discussão entre pesquisadores, tanto por seus aspectos formais quanto por suas motivações filosóficas. Em seu aspecto formal, a mais extensiva análise foi realizada por Turquette, em diversos artigos publicados entre 1967 e 1981. Turquette sugeriu que as matrizes da lógica triádica estão relacionadas por pares duais de operadores lógicos, formando um único sistema axiomático ao estilo hilbertiano. O objetivo desta comunicação é investigar a hipótese de que as tabelas dos operadores de negação, conjunção e disjunção de Peirce originam, de fato, três diferentes sistemas proposicionais multivalorados. Dois desses sistemas foram posteriormente descobertos por Łukasiewicz, Kleene e Bochvar, sendo por isso mais conhecidos na literatura sobre lógicas multivaloradas. Mas um deles, que chamamos de P3, é distinto dos demais, pois as sentenças somente recebem valor de verdade indeterminado quando seus componentes também são indeterminados. Seu estudo nos mostra que ele é funcionalmente completo e extensivo em relação à lógica clássica. Para demonstrar isso, primeiro adotamos uma noção de implicação material cujas sentenças têm valor de verdade indeterminado somente quando seus components também são indeterminados. Em seguida, supomos D = {1, 1/2} como o conjunto de valores designados. Além disso, mostraremos que o sistema P3 pode facilmente ser transformado em cálculos paraconsistentes ou paracompletos, adicionando a ele, respectivamente, operadores unários de consistência e negação intuicionista. Usaremos o método de prova por tablôs nesta pesquisa, o que nos permite provar que P3 é consistente e completo. Concluiremos apontando alguns problemas em aberto sobre o assunto.



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